Depoimentos
O filho pródigo contemporâno
Esta é uma história para cujo desfecho feliz tive a satisfação pessoal de contribuir. Tudo começou quando estávamos fazendo uma das muitas triagens que aplicamos junto à população de rua que frequenta o Prato de Sopa. O objetivo é sempre o mesmo: descobrir como foram parar nas ruas, se possuem documentos ou qualificação, se desejam voltar para a terra natal... essas coisas.

Foi quando me deparei, em um dos RGs apresentados, com um sobrenome familiar, o mesmo de uma companheira de banco de escola. Por motivos óbvios, não vou revelá-lo aqui, mas posso dizer que era o sobrenome de uma família bastante tradicional e de posses, com uma história de mais de 400 anos em São Paulo. Seria ele alguém conhecido?

Com muito jeito, fui conseguindo saber um pouco mais sobre o misterioso dono daquele RG, coisas que ele contou de forma às vezes confusa e desordenada, às vezes relutante, mas sempre envergonhada. De posse de seu nome completo e algumas poucas informações, telefonei para a minha antiga amiga de colégio. Ela disse não reconhecer o nome, mas que iria indagar junto a parentes mais distantes.

Distraída entre tantos afazeres, não pensei mais no assunto. Esta era apenas mais uma entre tantas histórias similares, de pessoas que se perderam no vício da bebida e chegaram a um nível de degradação praticamente sem volta.

Entretanto, depois de sete dias bateram à porta do Prato de Sopa dois irmãos daquele homem. Não tinham notícias dele há mais de três anos e chegaram a julgá-lo morto. Foi mesmo incrível! Vieram para buscá-lo!

Depois que tudo se acalmou é que eu soube mais sobre o nosso cliente: era engenheiro, tinha esposa e um emprego, até que a mulher o trocou por outro homem. A traição o levou a beber, ele perdeu o bom emprego que tinha e migrou para Manaus atrás de outra oportunidade e um recomeço. Mas as coisas também não deram certo por lá, ele se entregou de vez à bebida e foi "parar na sarjeta" (palavras dele). Conseguiu voltar para o Sudeste e acabou em Santos, onde vivia pelas ruas, sobrevivendo como podia. Não procurara a família porque sentia vergonha da própria situação.

Lembrei-me da parábola do filho pródigo, do Evangelho. A história tinha a mesma força e moral. Ele estava perdido e foi encontrado. Regozijemo-nos no Senhor!
Maria de Lourdes Magalhães Ozores

  voltar